A fé no mistério da encarnação do Filho de Deus pressupõe reconhecer a colaboração humana no plano da salvação, por isso a tradição católica venera as pessoas e acontecimentos que prepararam e anunciaram o nascimento do Salvador. Neste cenário, destaca-se a natividade da Bem-Aventurada Virgem Maria.
Celebrado no dia 08 de setembro, nove meses após a solenidade da Imaculada Conceição (08 de dezembro), o nascimento de Maria está associado ao nascimento do Redentor, a partir do simbolismo da aurora e do sol. Na língua portuguesa, conforme o Dicionário Aurélio (2003, p. 232), aurora significa: “período antes do nascer do Sol, quando este já ilumina a parte da superfície terrestre ainda na sombra”. O vocabulário popular reconhece a aurora como os primeiros indícios de uma nova realidade. A aurora marca a transição da noite escura (pecado e condenação) para o dia de luz (santidade e salvação); ela ainda não é a luz do sol, mas anuncia e prefigura o novo amanhecer. Na Sagrada Escritura, o Messias é chamado de sol (cf. Lc 1, 78) que veio trazer a salvação. A natividade de Maria é, portanto, a aurora da salvação porque marca o início de uma nova etapa na história da salvação: a vinda de Jesus Cristo, o Sol da Justiça. Não é ela quem salva, mas o seu nascimento anuncia que a salvação está próxima, a esperança da redenção é renovada.
A liturgia e a devoção popular ajudam a entender este paralelismo. A eucologia menor da Missa do Dia da Natividade de Maria ressalta na Coleta: “[…] assim como a maternidade de Maria foi aurora da salvação, a festa do seu nascimento nos conceda o aumento da paz” (Missal Romano, p. 796) e a Oração Depois da Comunhão, diz: “[…] o nascimento da Santíssima Virgem Maria, que foi para o mundo inteiro esperança e aurora da salvação” (MR, p. 797). A antífona mariana Ave Regina Coelorum afirma: “da luz do mundo és aurora” e o povo nativitano, no interior do Tocantins, em prece, reza: “o vosso ventre virginal trouxe-nos Jesus Cristo, como luz da tua aurora”; e cantam: “Se nasceis oh! Virgem como bela aurora, fazei-nos propício ver o Sol da Glória”.
Do magistério pontifício também nos vem palavras de profundo significado. São João Paulo II, na preparação para o jubileu da encarnação do Verbo, no ano Dois Mil, quis, em 1987, celebrar o Ano mariano. A intenção do papa era comemorar a natividade de Maria, cronologicamente, anterior ao nascimento do Salvador: “já está próximo, no qual o Jubileu bimilenário do nascimento de Jesus Cristo, nos leva a volver o olhar simultaneamente para a sua Mãe. Nestes anos mais recentes, foram aparecendo diversos alvitres que apontavam a oportunidade de fazer anteceder a comemoração bimilenária de um outro Jubileu análogo, dedicado à celebração do nascimento de Maria Santíssima” (Redemptoris Mater, n. 3). Além do fator cronológico, o papa também apresentou o simbolismo teológico da aurora e do sol: “Assim como a estrela, conjuntamente à aurora, precede o nascer do sol, Maria, desde a sua Conceição Imaculada, precedeu a vinda do Salvador, o nascer do Sol da Justiça […]” (Ibidem).
Celebrar a natividade de Maria é reconhecer um marco importante de um novo tempo na história da salvação. Muito mais do que a simples interpretação do “aniversário de Maria”, vislumbra-se um acontecimento histórico salvífico que aponta para o nascimento do Salvador e a eficácia do seu mistério redentor.
A Bem-Aventurada Virgem Maria da Natividade é a principal padroeira do Estado do Tocantins e do Regional Norte 3, por isso apesar do 23º Domingo do Tempo Comum e, em conformidade com as disposições litúrgicas, este ano, a Arquidiocese de Palmas e a Diocese de Porto Nacional apresentaram orientações específicas para a celebração desta festa. Que a Natividade de Maria seja aurora e esperança da salvação para o povo nativitano, tocantinense e de todo o Regional Norte 3!
Pe. Lucas Pereira dos Santos
Vice-reitor do Seminário Interdiocesano do Divino Espírito Santo